segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Comissão de estudiosos contesta dados do IEMA

Treze anos se passaram desde a primeira denúncia veiculada pelo Jornal da Praia da Costa, sobre despejo criminoso de sedimentos de dragagem próximo a linha de costa, sem que uma solução alternativa tenha sido proposta ou exigida pelos órgãos competentes até o momento. Pelo visto, empresas que pregam responsabilidade social, capitaneadas pelo órgão estadual licenciador, insistem em destiná-los para as nossas águas e praias, contribuindo para degradação dos oceanos.
Conforme matéria publicada na edição passada, a Vale e o IEMA estão devendo explicações à sociedade capixaba acerca da realização da audiência pública sobre o aprofundamento do Complexo Portuário de Tubarão.
Após a realização de duas reuniões com representantes da comunidade, do Instituto ORCA e do Gabinete do Vereador João Batista Babá (Presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal de VV), a Associação dos Moradores da Praia da Costa (AMPC) resolveu enviar ofício ao Ministério Público Estadual, apontando dúvidas e possíveis irregularidades dos órgãos sobre as obras de dragagem do Porto de Tubarão.
A medida conta com a parceria de outras entidades, como o Conselho Comunitário de VV, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal de VV.
O objetivo prioritário desta medida é fazer com que os órgãos responsáveis pela aprovação das obras de dragagem prestem informações à população de Vila Velha, Vitória e Serra, sobre as conseqüências ambientais que serão ocasionadas pelo despejo de material contaminado à distância irregular de 6 km da linha de costa.
Além disto, estes mesmos órgãos deverão informar com maior clareza os parâmetros e demais procedimentos tecnicamente pertinentes, através de nova Audiência Pública, além dos volumes finais e reais dos resíduos que serão despejados na frente das praias.

Riscos Ambientais

A região do Complexo de Tubarão, por estar localizada numa região de confluência dos rios que desembocam na baía de Vitoria, o Rio da Passagem sofre um acúmulo natural de sedimentos que ocasiona um ciclo periódico de dragagens. Entretanto é preciso ressaltar que os volumes até hoje dragados em todo o Estado não chegaram a 1,5 milhão de m³ para cada porto. A dragagem pretendida pela Vale prevê, sozinha, a retirada de 7 milhões de m³ de sedimentos.
Levando em conta a dragagem do Porto de Vitória (com 2 milhões de m³) e do novo Porto da Nisibra previsto para a enseada da Glória (com 1,2 milhão de m³), essas dragagens representarão, ao final das obras, em um despejo de aproximadamente 15 milhões de m³ no leito marinho. Para transportar esse material seria necessário enfileirar caminhões caçambas numa extensão equivalente entre Vitória e Campos-RJ, ou seja, 1.800.000 caçambas contendo 6m³ cada.
Conforme tabela publicada na obra “Dragagens Portuárias no Brasil – Licenciamento e Monitoramento Ambiental”1, o volume previsto para dragagem em todo os portos do Estado, até 2010, seria de 6,3 milhões de m³.
No entanto, as solicitações de licença, somente para a Baía de Vitória, foram aumentadas para 10,2 milhões de m³, ou seja, quase o dobro do previsto. Este volume, considerando o efeito “empolamento”(diferença de volume do material em seu estado natural para o estado solto) que será de aproximadamente 4,8 milhões de m³, corresponderá a um volume total aproximado de 15 milhões de m³ que serão despejados em frente à Praia da Costa.
Segundo estudos realizados na Carta Náutica, este despejo será feito a uma distância de 6 km da costa, apesar da Vale afirmar em seu Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) que essa distância será de 15 km, distância ainda muito próxima à costa. Segundo a mesma carta, o local do descarte no Porto de Tubarão aponta uma profundidade máxima entre 31 e 36metros, quando o RIMA apresenta este mesmo ponto de despejo com uma profundidade entre 36 e 46m. Isso representa uma alteração preocupante que ser dirimida pela empresa.
Estes dejetos são compostos de lama, argila, metais pesados - elementos químicos (extremamente perigosos para as espécies marinhas e para o homem ao absorvê-las), além de pedras e pó de minério. Ambientalistas acreditam que análises mais profundas deste material podem conter também substâncias cancerígenas.
Os estudos da Vale, encaminhados ao IEMA, não garantem categoricamente que os dejetos despejados em frente à Praia da Costa (conforme local, volume e a profundidade citados), não atingirão todas as praias dos municípios de Vila Velha, Vitória e Serra, ficando a dúvida e o receio de que danos ambientais possam ocorrer.

Precauções e Alternativas



Citação legal afirma que “não há como afastar a incidência do princípio da precaução, que ordena prudência na ausência de esclarecimentos necessários sobre tópicos relevantes, capazes de desencadear dano ambiental inegável e de proporções imprevisíveis”. As instituições e membros da comunidade que vem debatendo o assunto entendem que “o princípio da precaução deve ser observado tanto na esfera administrativa quanto na judicial”.
Com dados controversos e explicações pouco claras, não há como não gerar preocupação quanto às conseqüências imprevisíveis destas obras de dragagem, principalmente referente ao “bota-fora”. Surge, então, a insegurança de não estarmos sendo protegidos pelos órgãos que deveriam nos resguardar de possíveis danos ambientais.
Por todas estas razões e incertezas após análise detalhada do RIMA, a AMPC criou uma comissão multidisciplinar com o objetivo de obter maiores esclarecimentos sobre a questão, já que os documentos apresentados pelos órgãos competentes deixaram muitas dúvidas, inclusive sobre o envio de dados complementares que não foram apresentados por estes mesmos órgãos.
Esta comissão, composta de profissionais e estudiosos das mais diversas áreas (biólogos, engenheiros, oceanógrafos, técnicos em dragagem, ambientalistas, advogados, médicos, jornalistas, membros da comunidade entre outros) pretendem ampliar os estudos a respeito das conseqüências das dragagens e despejos em mar aberto.
Estudo realizado pelo Instituto ORCA- Pesquisa & Conservação Marinha, através do ambientalista e médico Lupércio Barbosa, e pela chefe de gabinete da Câmara Municipal, Rita Uliana, aponta a falta de dados sobre os efeitos cumulativos dos poluentes e índices de contaminação do substrato na região do “bota-fora” antes, durante e depois do descarte. O estudo ainda propõe alternativa para descarte do material dragado, além de questionar a falta de parecer IBAMA.
Considerando que o descarte próximo às praias causará prejuízo à biota marinha, conforme escrito no RIMA (“a vida de peixes, tartarugas, camarões, golfinhos, etc. pode ser afetada, gerando estresse, redução da produtividade e morte”) algumas alternativas estão sendo sugeridas. Uma delas é a construção de Unidade de Disposição Confinada (UDC). Este recurso vem sendo usado no Rio de Janeiro, para as obras de recuperação da Baía da Guanabara, que possibilita o confinamento da lama, impedindo a vazão dos resíduos para o mar e posterior aproveitamento para aterro e tratamento paisagístico sobre sua cobertura. Outra alternativa seria a utilização de GEOTUBES - processo de  encapsulamento do material contaminado em bolsas de polipropileno gigantescas, resistentes a degradação química e biológica, que promove a separação da parte sólida e líquida, promovendo a secagem e desidratação dos sedimentos,  podendo ser utilizados em construções de quebra-mares e situações de erosões costeiras, além de recifes, enseadas, ilhas e praias artificiais , comuns em países como EUA e Austrália. Outra idéia pioneira, a ser desenvolvida na dragagem do Porto de Rio Grande do Sul, prevê a utilização do material de dragagem para gerar energia elétrica à partir das grandes quantidades de ferro e enxofre contidas nesse sedimentos, uma proposta que oferece solução para um problema de esfera mundial - a destinação do material dragado - ainda por cima gerando recursos que poderiam, no mínimo, custear totalmente as obras de dragagem.
A falta de legislação aplicada às obras de dragagem portuária e de atualização dos estudos utilizados como parâmetros para elaboração dos projetos é também motivo de preocupação e debate por parte da sociedade, tendo em vista as políticas de desenvolvimento econômico a qualquer custo, apoiadas pelo poder público.

Fonte: Jornal Praia da Costa, Nº 151 - Julho / 2010 - Ano 12.

Um comentário:

  1. Estamos juntos nesta luta, gostaria que no site do forum aparecesse uma reportagem sobre os postes 138.000 volts. Anselmo

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